Por Gabriel Satoshi Kawata
Duolingo é um aplicativo de aprendizado de linguagens, que utiliza de um método de gamificação do ensino. Nos últimos tempos, o software de aprendizado tem-se popularizado devido a ampla divulgação em redes sociais, como Tiktok, X e Instagram. Todavia, para além da crítica a forma na qual o Duolingo constrói seu método de ensino pela gamificação – como apontado por diversos profissionais da área da Educação e Letras – recentemente tem sido divulgado um amplo uso de Inteligências Artificiais no gerenciamento das atividades elaboradas nesse processo de gamificação, o que tornou ainda mais defasado o ensino de línguas estrangeiras proporcionado pelo aplicativo. Outrossim, o presente artigo preliminar busca focar no que tange a área da precarização do trabalho devido ao avanço da IA utilizando o caso do Duolingo para análise.
Para tanto, a empresa que se tornou o Duolingo começou a utilizar a estratégia “AI-first”, isto é, inteligência artificial em primeiro lugar, substituindo o trabalho humano por softwares de inteligência artificial. De tal maneira, o CEO do software, Luis Von Ahn fez diversas falas do quão benéfico essa mudança seria, tanto para os usuários quanto para os funcionários da empresa. Dentre as falas do CEO, destacam se essas:
“Pela primeira vez, ensinar tão bem quanto os melhores tutores humanos está ao nosso alcance”
“uma empresa que prioriza a IA”
“Duolingo continuará sendo uma empresa que se importa profundamente com seus funcionários”
“Mudanças podem ser assustadoras, mas estou confiante de que este será um grande passo para o Duolingo. Isso nos ajudará a cumprir melhor nossa missão — e, para os Duos (funcionários), significa estar à frente do mercado no uso dessa tecnologia para realizar o trabalho”
Em análise, denota-se então o que o acadêmico Nick Srnicek ressalta ao conceituar Capitalismo de Plataforma, em que
Uma nova categoria de firma modela o mundo dos negócios, reconfigurando o capitalismo em uma drenagem generalizada de recursos. O capitalismo de plataforma (Srnicek, 2017) emerge com os algoritmos, em infraestruturas pelas quais passam consumidores, anunciantes, produtores, produtos e serviços. Plataformas crescem exponencialmente porque não precisam construir fábricas e mercados do zero; o que fazem é promover infraestrutura para todos os tipos de atuação. São constituídas de linhas de programação algorítmica; atuam como mediadoras. (Chagas, Alexandre; Junior, João Bottentuit; Santos, Edméa (org), 2024, p. 156)
Em consonância à essa reflexão, a filósofa Shoshana Zuboff discorre sobre seu conceito de Capitalismo de Vigilância, na qual:
Um novo continente de superávit comportamental é confeccionado a cada instante a partir dos muitos fios virtuais da nossa vida cotidiana quando ela colide com o Google, o Facebook e, de forma mais geral, com qualquer aspecto da arquitetura mediada por um computador com acesso à internet. (Zuboff, 2021, p. 154)
Dessa forma, denota-se o papel que a Duolingo, como um mecanismo no mercado das Big Techs como meio de reprodução dos carácteres tanto do Capitalismo de Plataforma, bem como o Capitalismo de Vigilância. Tamanho avanço do investimento bilionário das big techs em inteligências artificiais abrem margem para o questionamento no que tange o trabalho humano.
À exemplo do caso do Duolingo e o investimento em inteligência artificial para substituir o trabalho humano, educadores questionam o real valor desse ensino. Dado esse fato, denota-se como
Nossa relação com os atos de ensinar, aprender, cartografar, ler, escrever de maneira multimodal e produzir conhecimento mudará sobremaneira devido à presença cotidiana das soluções de IA. Criticar seus contextos produtivos, aplicações capitalistas, dataficação, jogos de interesses das grandes corporações continua sendo importante e fundamental. Por outro lado, não podemos ignorar o fenômeno e muito menos deixar de conhecer e aplicar estas mesmas soluções em nossos projetos educacionais que são engajados com pautas autorais e libertárias. Como docentes e pesquisadores que somos, é importante ativar e compreender as atuais “operações de usuários“ à moda das pesquisas com os cotidianos. Dialogar sobre nossos dilemas e ir ao encontro dos etnométodos continua sendo nossa grande aposta. (Chagas, Alexandre; Junior, João Bottentuit; Santos, Edméa (org), 2024, p. 6)
Objetivamente, torna-se de suma importância elaborar a crítica sobre o avanço das Big Techs e as inteligências artificiais, bem como o impacto cotidiano disso, como é o caso do Duolingo e as relações de trabalho e exploração capitalista na qual essas grandes empresas estão inseridas, isto é, no meio digital.
Referências
ARISTIDES, Allana. Início de uma nova era digital: Duolingo está substituindo talento humano por IA para criação de conteúdo. IGN Brasil, 2025. Disponível em: <https://br.ign.com/tech/139755/news/inicio-de-uma-nova-era-digital-duolingo-esta-substituindo-talento-humano-por-ia-para-criacao-de-cont>. Acesso em 13 junho 2025.
CHAGAS, Alexandre; JUNIOR, João Bottentuit; SANTOS, Edméa (org). Chat GPT e educação na cibercultura: fundamentos e primeiras aproximações com inteligência artificial – São Luís: EDUFMA, 2024.
MEIO e MENSAGEM. Nos EUA, Duolingo “apaga” perfis após críticas sobre uso de IA. Meio e mensagem, 2025. Disponível em: <https://www.meioemensagem.com.br/marketing/nos-eua-duolingo-apaga-perfis-apos-criticas-sobre-uso-de-ia>. Acesso em 13 junho 2025.
SRNICEK, Nick. Platform capitalism. Cambridge: Polity Press, 2017.
UOL. Duolingo vai substituir trabalhadores contratados por sistema de IA. Uol, 2025. Disponível em: <https://economia.uol.com.br/noticias/redacao/2025/04/30/duolingo-vai-substituir-trabalhadores-contratados-por-sistema-de-ia.htm>. Acesso em 13 junho 2025.
VELOSO, Thássius. O que é “AI First”, nova tendência que pode impactar seu emprego. CBN, Rio de Janeiro, 2025. Disponível em: <https://cbn.globo.com/comentaristas/thassius-veloso/analise/2025/05/09/o-que-e-ai-first-nova-tendencia-que-pode-impactar-o-seu-emprego.ghtml>. Acesso em 13 de junho de 2025.
ZUBOFF, Shoshana. A era do capitalismo de vigilância: a luta por um futuro humano na nova fronteira do poder. Rio de Janeiro: Editora Intrínseca, 2021.